Então muito boa tarde vamos iniciar as nossas conversas sobre a temática pais e filhos em casa, e hoje vamos iniciar com o Dr. Pedro Ribeiro que é médico assistente hospitalar de medicina interna no centro hospitalar Tondela-Viseu e também na Casa de saúde de São Mateus em Viseu. O tema que vamos falar com o Pedro Ribeiro é sobre a quarentena o mal necessário.
Mário: Boa tarde Pedro, muito obrigado por teres aceite este convite, para nós é uma honra falar desta temática como a pessoa tão experiente, sei também que, não estando na linha da frente convives diretamente com esta situação no centro hospitalar no qual te encontras e daí pedia que nos falasses de forma genérica daquilo que é este mal necessário da quarentena e daquilo que também vivencias todos os dias no centro hospitalar de Viseu.
Dr.Pedro: Então para já muito boa tarde, para mim também é um gosto estar a partilhar aquilo que é a minha experiência na matéria convosco, experiência essa que é pouca mas não só a minha como de toda a gente e na questão que se nos põe perante esta infecção, pelo chamado novo corona vírus ou COVID-19, a grande questão que se põe é realmente até onde é que vai o nosso conhecimento sobre esta nova doença? Nós o que sabemos é extrapolado daquilo que foi a crise da SARS em 2002, portanto há 18 anos atrás desencadeada por um vírus aparentado deste novo corona vírus, na altura foi uma estirpe corona vírus a desencadear a infeção, e daquilo que foi até mais recentemente a crise do MERS (síndrome respiratória do Médio Oriente), mas em relação a esta situação concreta a experiência ainda é pouca, o conhecimento médico e científico em relação a esta infeção, este COVID-19, assim denominada ainda é pouca vai se agora acumulando conhecimento sobre aquilo que é a COVID-9 como aparece, como são as fontes de contágio como são as formas de contágio como são as manifestações clínicas e quais são as consequências em termos não só clínicos diretos para a pessoa ou utente que contrai a doença mas também em termos de saúde pública, em termos de repercussão a nível da população em si.
Dr.Pedro: Ora bem, nós neste momento do pouco que sabemos há algumas coisas que são certas isto não tem cura, não é como a gripe que tem tratamento, não é como outras doenças virosais que têm tratamento ou mesmo cura, esta não tem tratamento não tem cura, pelo menos que se conheça. Há uma série de tratamentos em fase experimental mas neste momento para além desses protocolos de terapêutica experimentais, não há um tratamento específico para COVID-19 a única coisa que a gente sabe que é mais ou menos certo é a forma de transmissão deste vírus e que é por cutículas
respiratórias, não é um vírus que vive no ar ele vive no meio, precisa de estar no meio para subsistir, seja no meio de pequenas gotículas que saem da nossa boca, nem precisam ser aquelas mais básicas que a gente chama na brincadeira, os gafanhotos, basta aqueles pequenos aerossóis invisíveis, ele vive aí, mesmo nas superfícies, começamos a saber agora que é um vírus até resistente, e resiste algumas horas ou mesmo dias em determinadas superfícies e portanto daí a necessidade da higienização constante das superfícies e das mãos e das superfícies de contacto de onde há doentes. Portanto, isto é o que a gente sabe daí a única forma de travarmos a doença nesta fase, é travarmos as formas de contágio e travando as formas de contágio implica haver o chamado distanciamento, implica os chamados métodos de barreira.
Mário: Mas tu há bocado disseste que ainda não eram conhecidas todas as formas de contágio… Mas algumas são aquelas…
Dr.Pedro: A forma de contágio é sabida que é por via inalatória, mas só que, só recentemente é que se começa a saber quanto tempo o vírus resiste nas chamadas gotículas, quanto tempo resiste nas superfícies portanto só recentemente é que se soube exactamente quanto tempo ele vive e dura no ambiente, agora uma coisa é certa, ele não vive no ar não é pelo facto de respirarmos o ar num local aberto e arejado de uma pessoa que é portadora do vírus que nós vamos contrair o vírus é preciso haver uma interação direta com essa pessoa e hoje estamos a falar frente a frente sem nenhum método de barreira entre nós, mesmo em relação às máscaras um exemplo do que se vai descobrindo nesta matéria prende-se por exemplo com a questão das máscaras e tanto tu como todo mundo vêem a conversa e a que a questão das marcas têm levantado e que ainda hoje não é unânime, portanto isto vai mudando à medida que o conhecimento se vai consolidando também a opinião científica e os conceitos vão sendo atualizados.
Mário: E qual é a tua opinião relativamente às máscaras?
Dr.Pedro: As máscaras são necessárias, as máscaras são uma barreira para a projeção de gotículas, agora há máscaras e máscaras, todas as máscaras são diferentes, a máscara mais comumente usada
é a chamada máscara cirúrgica ou de procedimentos essa é a chamada máscara, ai como é que se diz, altruísta porque protege os outros de nós, eu usar uma máscara cirúrgica, aquela máscara que vulgarmente se vê, estou a proteger os outros de mim, aquilo faz uma barreira às gotículas que eu exalo, mas não me proteja a mim dos aerossóis que outra pessoa que possa exalar na minha direção.
Mário: Então, porquê?
Dr.Pedro: Porque não são feitas para isso, as máscaras cirúrgicas servem para proteger o meio, neste caso o doente ou o campo operatório das partículas que são exaladas pelo médico ou pelo profissional de saúde.
Mário: Então por exemplo uma pessoa que esteja ao pé de mim vai exalar gotículas diretamente para mim, ok e que não esteja dentro daquela barreira de segurança dos dois metros, essa pessoa estando eu com máscara, pode-me infectar? Com uma máscara dessas de bloco operatório.
Dr.Pedro: Com o risco inferior a não teres nada, mas sim, há essa possibilidade mas a probabilidade reduz-se drasticamente se ambos usarem máscara, protegem-se um ao outro as máscaras de procedimentos, o uso generalizado delas permite criar uma barreira de grupo ou seja, todos protegem todos, já os profissionais perante procedimentos invasivos, por si só, já são procedimentos
de alto risco devem usar máscaras com o nível superior de proteção individual, são chamadas as máscaras FP2 ou N95 de acordo com a certificação europeia ou americana. Essas sim permitem filtragem de cerca de noventa e cinco porcento de todas as partículas constantes que existem no ar e portanto essas máscara, chamada máscara inteligente protege-me a mim e protege o outro só que são máscaras complexas bastante desconfortáveis de usar são as máscaras que provocam aquelas lesões faciais que tanto se vê no facebook os profissionais de saúde e garanto que eu na quinta-feira usei uma durante duas horas e fiquei marcado, bem marcado, aqui assim. E portanto não é isso de serem mais complexas mais desconfortáveis não são práticas para um uso quotidiano, a questão que se poem é as máscaras serem usadas por todos, assim todos protegemos todos, e vê-se o a Coreia o Japão, mesmo na China onde há esta cultura de usar métodos de barreira a forma com eles fizeram a contenção, sobretudo na Coreia onde fizeram a contenção eficiente da propagação da infecção todos saem de máscara à rua, mesmo em Hong Kong e Macau foi decretada a obrigatoriedade, logo desde o início, de todos usarem máscara na rua, mesmo que saia à rua tem que usar máscara, ninguém entrava num transporte público sem máscara que é a criação dessa barreira de grupo, não tem nada a ver… desculpa lá, deixa acabar isto não tem anda haver com aquela tanga da imunidade de grupo, que foi ventilada pelo Borris lá da Inglaterra que agora já mudou de opinião não é, vaisse lá saber porquê e por aqueles Holandeses que têm de deixar de fumar umas “roscas” em Amestardão a imunidade de grupo adquire-se com vacinação, não é com infeção ok, a imunidade de grupo adquire-se com vacinação não é com infeção.
Mário: Isso é importante isso é muito importante que se diga e era uma das questões que eu te ia por a seguir, era desta situação da imunidade de grupo que não foi só o primeiro-ministro inglês mas também o senhor Trump no início e o senhor Bolsonaro, que aliada a essa ainda diz outras enormidades, mas pronto tu já respondeste a imunidade de grupo cria-se com a vacinação, tu no início deste nosso diálogo também disseste que não havia cura para isto, mas todos nós estamos muito esperançados nesta cura e não queremos acreditar que isto seja uma situação fatal agora a pergunta que eu te quero colocar é que, quando tu dizes que não existe cura vaticinas que isto seja uma situação que vá continuar nas nossas vidas ou por outro lado aguardas e esperas, que exista a breve trecho uma vacina que possa depois causar essa tal imunidade?
Dr.Pedro: Oh Mário, então vamos lá ver uma coisa a vacina é necessária dadas as repercussões da doença, é uma doença que mata, tudo bem, até pode matar quem já está predisposto a ter uma fatalidade, os idosos, pessoas com múltiplas doenças crónicas ok, são pessoas que estão prédispostas a ter uma fatalidade por qualquer outra causa esta é mais uma, tudo bem, isto é considerada que é uma daquelas causas evitáveis, portanto havendo uma vacina permite proteger sobretudo quem, os profissionais que lidam diretamente com a doença, tal como aconteceu com a gripe A em 2009 é que a prioridade foi vacinar os profissionais, para não se perder essa frente, e logo a seguir então começar a proteger a população porque o que se vaticina já se disseminou no planeta possa com o passar do tempo a reconstituir o quinto cerótico de coronavírus circulante na natureza muitos anos que circulam na natureza, para esta estirpe nós não temos a chamada imunidade portanto nunca tivemos contacto, estamos expostos a ela quase, um bocadinho em exagero, mas quase como os aztecas e os incas estiveram expostos a gripe no século 16 portanto é uma doença que até poderia ser benigna se já tivéssemos algum grau de exposição se tivéssemos tido algum grau de contato, se tivéssemos algum tipo de imunidade, mas não temos.
Mário: Mas a vacina serve para quê ao fim e ao cabo? A vacina vai servir para quê?
Dr.Pedro: Para diminuir a incidência e a gravidade da doença, sobretudo essas duas coisas, porque isto parecendo que não, o drama disto não é o facto de que matar, o drama disto para além da morte é o desgaste em termos de cuidados de saúde que isto provoca os cuidados de saúde para tratar estes doentes que têm de ser tratados, desviavam-se muitos recursos e desviam-se muitos recursos para os tratar falta, que faltam em algum lado para tapar a cabeça tem que destapar os pés e isto consome recursos, recursos valiosos. Não há aqui oferta das patacas à porta de cada Hospital, portanto a vacinação servirá para diminuir, criar alguma imunidade na população, e diminuir a incidência da doença, transformá-la numa doença banal, como a gripe. A vacina sasonal da gripe transforma a gripe numa doença banal quase.
Mário: Agora uma questão que quase todas as pessoas querem ver respondida é se, nós a partir de agora vamos poder viver à vontade como vivíamos até então, continuar a dar os célebres beijos, os célebres abraços, os célebres apertos de mão, ter os contatos que é tão típico dos povos latinos entre pessoas, ou será que as máscaras e as luvas vão fazer parte da nossa indumentária diária e do nosso vestuário.
Dr.Pedro: Eh pa, sinceramente eu aí acho que, não sei sinceramente, não sei o que te vou responder, não faço ideia todos os povos com as culturas diferentes que têm, com modos diferentes de ver a vida, porque nós somos latinos como os Espanhóis, Franceses e Italianos mas somos diferentes deles, apesar de tudo, somos muito mais pacatos, digo mais pacatos acatamos melhor as ordens
das políticos dos governos, acatamos melhor e continuamos a ter um bocadinho de chico-esperteza mas somos um bocadinho mais mansos na forma de levar as coisas, acatamos melhor.
Somos iguais mas somos diferentes, eu não sei dizer sinceramente como é que isto como é que vamos recuperar em termos das relações interpessoais desta crise parecendo que não esta crise lançou um ambiente de semi-histeria de massas, um wave de paranóia que vai deixar sequelas em termos culturais, em termos de comportamento.
Dr.Pedro: A minha fé é que a gente saia disto como se saiu de uma guerra ou seja, assim que isto terminar vamos fazer festarola de todo o tamanho isto é como o fim da guerra, vai ser uma festança de todo o tamanho.
Mário: Esta festa não será perigosa?
Dr.Pedro: Oh pa, pois agora resta saber como não é a malta começa a verter uns tintos também cai de umas escadas abaixo, e aí também pode morrer mais até do que pelo coronavírus terá que ser uma coisa também progressiva. Era bom, que houvesse um cessar fogo, nas guerras há um cessar fogo, aquilo termina de um dia para outro.
Aqui não vai acontecer isso, as medidas restritivas vão sendo retiradas aos poucos e poucos, nós não vamos ter aquele dia da festarola danada, vai haver essa vontade, mas não pode haver, havemos de festejar possivelmente lá mais para frente, e quando digo mais para a frente, amigo vamos contar do verão para a frente tá bem.
Agora eu tenho uma expectativa, e eu gostava que se concretizasse, era que continuássemos a ser o povo afectuoso que somos. Somos sobretudo isso, os portugueses são afectuosos, mas que esta crise nos permitisse ter um comportamento similar por exemplo aos japoneses, em que alguém com febre não vai trabalhar só porque tem vontade de ir trabalhar, fica em casa. E se tiver que sair para o centro de saúde põe uma máscarazinha quando sai, protegendo os outros dele mesmo com uma simples gripe, uma simples constipação, agarrar nas máscaras que na altura vai haver muita máscara à venda nas famácias a preços bem mais convidativos do que os que há agora as pessoas vão ter uma pequena reserva de máscaras, para que quando estão doentes ou constipadas ponho a minha máscarazinha e saio à rua, se houver esses cuidados, então já terá, pelo menos nesta crise já há uma coisa positiva, tal como em conversa com o colega… observámos uma situação, é que a taxa de infecção hospitalar não COVID, portanto, não tem nada haver com COVID baixou drásticamente nestas últimas semanas, essa análise ainda não foi feita, isto é uma avaliação empírica, uma coisa a olho Porquê?
A restrição das medidas deverá ter contribuído para isso, mas esta crise também nos fez incidir num aspecto, é que começámos a ter os cuidados de higienização que já deveríamos ter no dia a dia, e se nesta crise criarmos uma nova cultura, uma nova praxis em termos dos próprios profissionais de saúde, em termos de higienização e da prevenção geral da transmição de infecções hospitalares, então também é já algo que esta crise terá contribuido com algo positivo.
Resumindo, sinceramente eu espero que daqui a meio ano todos estejamos a dar um abraço, a encontrar o meu amigo dar-lhe um abraço, dar-lhe um aperto de mão, dar um bacalhau sim senhora, mas continuamos a ter os cuidados de higienização e se eu tiver que sair à rua sair com uma máscarazinha e limpar as mãozinhas e não cumprimentar ninguém, se tiver a nítida sensação que a minha mão não está limpa.
Mário: Eu também queria por aqui uma questão relativamente a isso que tu falaste de neste momento irem muito menos pessoas às urgências do que iam, vocês também pronto, se calhar de uma
forma empírica poderão não ter números ainda, mas não acham que assim uma percentagem bastante grande das pessoas que vão às urgências em portugal o fazem por conforto ou porque querem falar com alguém, ou porque têm necessidade de conviver e estão muitas das vezes sozinhas em casa e o fazem de uma forma muitas vezes leviana, sem terem necessidades de lá ir, isso também não é demonstrativo nestes números que vocês neste momento começam a ter ao nível das urgências nos hospitais públicos de Portugal?
Dr.Pedro: Meu amigo em resposta a isso se isso fosse uma questão de escolha múltipla eu iria agora pôr cruz no item que diz todas as anteriores, todas essas questões, tudo o que disseste sim, é verdade e acontece, isso já a gente sabe que existe mas não é só isso, o tal wavezinho de paranóia que se instalou nesta crise faz com que as pessoas fujam do serviço de urgência, porque os serviços de urgências não foram separados em urgências dedicadas COVID, e urgências não dedicadas ao COVID, toda a linha da frente dos serviços de saúde em Portugal passou a receber doentes COVID, e as pessoas sabem disso, todos os hospitais recebem doentes potencialmente COVID e as pessoas fogem, onde é que posso dizer que observo isso, eu trabalho desde 2008, 2009 na unidade de AVC aqui em Viseu mas até início de Março estávamos a fazer uma cerca de 15 a 20 fibrinólises por mês, o tratamento do avc isquêmico agudo, e tínhamos sem exagero entre duas a três admissões por dia na unidade quando mais ou menos o número equivalente de vias verdes, posso dizer que esses números baixaram para metade.
De igual forma os doenstes que nos chegam, chegam já com lesões constituídas, muitos deles, já para lá da capacidade de intervenção e de resgate daquele tecido cerebral, isto porquê? porque muitas vezes é uma população idosa e quem dá o alarme é os quem visita que deixou de o fazer, mesmo os serviços de apoio domiciliário começaram a restringir as suas visitas ao mínimo, o mínimo às vezes não chega. O bater à porta e deixar o saco à porta não chega se a pessoa está lá dentro e não responde, e só umas horas depois é que dão conta que não responderam, portanto sim, o que disseste é verdade, esses empatas, essa malta acabou por desaparecer da urgência, mas também desapareceram os outros.
Mário: Pois o que é grave!
Dr.Pedro: O próprio bastonário da ordem do médicos já veio dizer, onde é que andam os diabéticos descompensados? Onde é que andam os bronquiticos descompensados, os asmáticos nesta altura de Primavera onde é que andam?
Mário: Claro, e mais uma questão que eu te queria por, era que neste momento em que em que fase é que nós nos encontramos em Portutal, estamos perto daquela tal curva que neste momento falam de planalto, não estamos, em que fase é que nós nos encontramos neste momento.
Dr.Pedro: Olha, sinceramente não te sei responder a isso. Os nossos números são muito oscilantes, temos uma taxa de incidência de acelaração da doença que é mais ou menos constante, andamos há uma semana com uma taxa de crescimento abaixo dos 10% o que é bom, é bom, mas é bom só num sentido, é que termos um aumento de 10% ou inferior todos os dias não quer dizer que o número de casos não está a aumentar, está.
O que quer dizer é que amanhã vamos ter mais 6% de casos que tivemos hoje, e no dia a seguir outros mais 6%, e no dia a seguir mais 6%, ou seja, enquanto isto for sempre acima de zero é mau. Porque há um aumento, agora este aumento controlado abaixo dos 10% permite uma gestão, permite haver algum folgo nos serviços de saúde para se adaptarem às necessidades de prestação de cuidados, só isso. É só essa a parte boa, termina aí, agora claro que quando esta crise começou foi projectado para Portugal, um cenário similar aos países já estão a enfrentar essa crise, como na França e Itália, e a nossa progressão de casos é claramente inferior áquilo que era projectado, também isso é uma coisa boa revela dois aspectos importantes, revela que houve medidas a serem tomadas atempadamente e uma coisa muito mais importante, é que os portugueses, a malta cumpriu, percebeu e cumpriu, porque de nada adiantaria haver decretos a ser emanados de Lisboa e a malta borrifar-se, que aconteceu infelizmente em Itália. Porquê? porque essa é a cultura deles, é aí que nós marcamos a diferença, o português acata, claro depois anda o correio da manhã e a tvi atrás aí daquela malta que tenta atravessar a ponte sobre o Tejo, claro que a gente sabe que houve malta a fugir para o Algarve claro, logicamente.
Agora nunca se iria conseguir fazer em Portugal aquilo que se nas regiões autónomas, as regiões autónomas têm uma coisa boa que têm o mar à volta, dá para fazer uma cerca sanitária, foi isso que foi feito com bons resultados temos que reconhecer, não é, agora em Portugal isso seria impossível e ainda assim a malta cumpriu e do pouco que temos cumprido os resultados estão à vista agora, ainda hoje ouvi a ministra dizer, e reconhecer, e muito bem porque isto não é só dizer que está tudo bem, há que reconhecer a insuficiências, é que casos declarados corresponderão a três quartos dos casos reais sim, que significa que temos mais casos por aí mas isso apenas significa que não devemos ficar assustados, isto não é o bicho papão que nos vai comer a todos, temos que ser cautelosos, zelosos e cautelosos porque nós não sabemos a quem é que isto vai fazer mal, a infecção por COVID-19 é uma infecção que é benigna em 80% dos casos é uma infecção que em 5% dos casos espeta com um gajo nos cuidados intensivos 5% parece muito pouco, 5% de 100 mil são 5 mil se nós neste momento tivéssemos uma incidência de doença de 100 mil casos, como há em Espanha, nós neste momento já teríamos ultrapassado em cinco vezes a capacidade instalada em Portugal de cuidados intensivos.
Portanto, é só para vemos que isto não é só falar em números, é depois traduzir isto para a realidade e portanto a infeção por COVID-19 é uma infeção quase como a roleta russa, a câmara tem dez espaços num deles está a bala. Agora eu não gostava ainda assim não gostava de jogar á roleta russa com essa pistola, portanto é preciso termos cuidado, sermos cautelosos seguir as regras, e se de hoje para amanhã disserem sim senhora temos que andar todos com máscara na rua, andamos todos durante uma temporada com máscara na rua, o que é que isso custa?
Mário: Pois, isso é um hábito, eu lembro-me perfeitamente há uns anos atrás, anos não, há uns meses atrás nós víamos aquelas notícias da China e do Japão e víamos aquelas pessoas com máscara e nós, pronto, à boa maneira portuguesa dizíamos aqueles gajos são malucos, são parvos ou alguma coisa qualquer, houve também da parte da direção-geral de saúde, é assim, alguma resistência relativamente a uso da máscara, ainda não está completamente declarado, pronto mas de facto a máscara tal como a quarentena, e uso das luvas e outras medidas que foram utilizadas, são estas as
medidas estão a fazer toda a diferença é ou não é?
Dr.Pedro: Exactamente, e portanto é isto que as pessoas têm que sentir, é que isto é um esforço estar em casa, ninguém gosta de estar em casa é um esforço enorme estar em casa, mas é um esforço necessário. Mesmo para o governo decretar medidas tão restritivas é mau, qual é o governo que paralisa completamente o tecido econômico de um país, 80%-85% da nossa economia está parada nenhum governo assume medidas destas de ânimo leve e portanto, o termos assumido estas medidas é porque é mesmo um mal necessário não há neste momento alternativa meus amigos, não há e se houvesse de certeza que já alguma coisa tinha sido ativada, não há e a prova está, não está em Portugal, a prova está nos Estados Unidos que sempre estiveram em negação, o senhor Donald Trump sempre esteve em uma mais pura negação das evidências, apenas e só para não quebrar a economia e agora tem um problema sanitário de tal ordem, que não vai fazer vergar a economia deles vai fazê-la arrastar-se de joelhos, durante muitos meses. A quarentena é um mal necessário? É.
Mário: Pedro, há aqui também mais uma questão que as pessoas gostariam de ver mais ou menos respondida por ti eu por exemplo, eu ao sair de casa aqui na zona da minha casa de vez em quando faço uma caminhadazinha uma vez, duas vezes por semana, aqui na zona muito aqui ao lado de minha casa casa, porque sei que todas as ruas não estão povoadas, não encontro pessoas e ando aqui num raio de 200/300 metros, agora há uma situação que já foi veiculado também pelos órgãos de comunicação social, que é a questão dos pés a questão, se nós por exemplo calcamos algo que possa estar contaminado ou o facto de nós andarmos a caminhar num terreno, na estrada, no alcatrão ou alguma coisa assim possamos com os pés trazer o vírus para dentro de casa, o que é que nos tens a dizer relativamente a isto, e que cuidados que deveremos ter também com esta situação?
Dr.Pedro: Olha então é assim, realmente há alguma especulação sobre se o vírus resiste em pavimentos e se com isso poderá ser transportado para o interior das habitações ainda é só especulação, não há dados concretos em relação a essa potencial forma de contágio ou contaminação, neste caso do ambiente, o que se sabe é que outros vírus, outras estirpes, outros germes há em que tal acontece, e aí nada como invocar outros povos, como os povos orientais onde há o hábito cultural de não entrar calçado em casa.
Portanto Mário, na dúvida arranjas uma sapateirinha à porta de casa, e a gente entra poem os sapatinhos na sapateira, e vem de chinelos cá para dentro.
Mário: Pronto e o calçado que nós andamos na rua, fica sempre cá fora e andamos sempre com esse na rua, pronto.
Dr.Pedro: Exatamente, nada como começar a haver o hábito, eu tenho, já há muitos anos que tenho. Aqui em casa tenho a sapateira na garagem, porque entramos pela garagem, os sapatos ficam lá não vêm cá para cima, e portanto é uma questão das pessoas começarem a adaptar, os sapatos ficam à porta, é dali, daquele espaço onde está o tapete, o hall de entrada daquele espaço da entrada não passam.
Mário: São hábitos de higiene que nós portugueses que eu considero que sejamos um povo, com hábitos de higiene bastante bons, porque eu conheço povos e tu também conheces, que têm muito menos higiene do que nós, nomeadamente os chineses e outros tais, que é mesmo assim agora de facto há hábitos de higiene que nós temos que começar adquirir para começarmos a prevenir este tipo de viroses, e este tipo de insistências, uma pergunta mais, que tu há bocado também falaste e eu depois não pude provocar, tu falaste há bocado, no início da nossa conversa que ou acho que foi em off, que estas situações destas viroses não iriam embora e iríamos potenciar outro tipo de viroses, e defendes tu que isto se calhar vai ser algo com que nós tenhamos que viver daqui para a frente, que é que nos tens a dizer sobre isso?
Dr.Pedro: Infelizmente é, infelizmente o que esta crise de SARS-cov-2 nos demonstra é que nós não estamos imunes há toda uma série de série de doenças virosais e não só que cada vez mais começamos a descobrir, isto pode também nos permitir ver que o depósito animal, a forma como um ser humano interage com o meio natural e predispõe estas situações irá expor-nos a outras potenciais crises, por outros agentes, não digo que seja um outro coronavírus mas por outro vírus qualquer, e a globalização, a forma como o transporte de massas se dá em todo planeta,
fará com que qualquer situação destas circule e de dissemine com uma velocidade, quase há velocidade da luz.
Portanto, estaremos em risco de enfrentar outra situação semelhante, infelizmente estamos a não ser que saiamos desta crise do COVID-19 de forma, completamente diferente, virando costas à globalização se voltarmos aos hábitos da globalização que tínhamos antes, sim é um risco que teremos de enfrentar uma nova crise destas.
Mário: Olha Pedro para terminarmos eu tenho aqui quatro perguntas. que gostaria que respondesses, de uma forma muito pragmática e direta. Primeira pergunta é, a COVID-19 é uma espécie de gripe ou não?
Dr.Pedro: Não, está mais que provado que não é uma espécie de gripe. Pode ter umas manifestações iniciais semelhantes a uma simples gripe mas não é, uma simples gripe. É como disse há bocado nas suas formas mais graves, é uma doença que mata, e não mata só as pessoas de idade com doenças crónicas e portanto é uma verdadeira roleta russa e que alguém vai levar bala, e portanto é daquelas doenças que por mais inocentes que possam ser em 70 ou 80% dos casos é preferível não ter.
Mário: Segunda questão, as medidas de isolamento são mesmo necessárias ou há algum tipo de alternativa para para nós termos?
Dr.Pedro: É assim a alternativa passaria pela vacinação ou por um tratamento, na falta de vacina e na falta de tratamento única arma que temos, e que se baseia na única fonte de conhecimento sólido sobre esta doença, que é a forma de contágio é exatamente actuar a montante na doença a actuar a montante é actuar logo na fase de contágio, portanto sim, infelizmente não há neste momento uma alternativa tão viável como as medidas de isolamente.
Mário: Então aconselhas a 100% as medidas de isolamento?
Dr.Pedro: Neste momento, perante a evidência actual, sim.
Mário: Muito bem, terceira questão, o que nos espera depois desta crise, já falámos um bocadinho sobre isto, e poderá haver uma nova vaga também já respondeste há bocado não é?
Dr.Pedro: Pois, o que é que nos espera, não sei o futuro espero que, haja uma mudança hábitos para melhor, hábitos de higiene não só a nível da população mas também a nível dos próprios profissionais de saúde, a nível dos cuidados de saúde. Agora, haverá outra crise? Estou convencido que sim, vai haver outra crise. Quando? não sei. Contigente? não sei Nem eu nem ninguém certamente, mas infelizmente a história, a história cíclica nesta matéria, vamos a entender que sim, vamos infelizmente enfrentar novas crises esperemos que na altura estejamos melhor preparados para as enfrentar.
Mário: Última pergunta, poderemos enfrentar outra crise com a mesma gravidade, tu falaste podemos enfrentar outras crises, agora saber-nos-a dizer se, com a mesma gravidade mais grave, menos grave, o que é que, eu sei que está uma pergunta muito complicada, e com grau de incerteza muito grande mas tu como médico podes ter uma percepção muito distinta de nós temos cá fora.
Dr.Pedro: Tenho duas palavras para ti, ébola, marburg são dois vírus que causam febres enterohemorrágicas, ambos os vírus, vírus de de marburg entendem de uma região de Angola. Tas a ver as ligações entre Angola e Portugal. Portanto são vírus também altamente contagiosos o ébola, são aparentados um do outro, são tão contagiosos que são vírus altamente resistentes e que têm taxas de mortalidade extremamente elevadas portanto amigo, estou a falar de vírus que estão ativos na natureza estão ativos no ser humano, portanto poderemos vir a enfrentar crises como esta? Sim, mais graves? Há uma forte probabilidade de isso poder acontecer. Mas daí ela está, esperemos que estejamos todos bem mais preparados culturalmente e em termos técnicos para depois poderem enfrentá-los.
Mário: Pedro, para terminarmos agradeço imenso a tua disponibilidade acho que as pessoas depois desta desta conversa irão dissipar muitas das dúvidas que têm.
Gostaria só que deixasses aqui um ponto, como é que tu achas que todos nós conseguimos resistir a tanto tempo em casa, o que é que tu achas que deveremos pensar, para continuar-mos a estar em casa para continuar-mos a ter esta luta magnífica, que tu ainda há bocado disseste que os portugueses estão a ter quais são as tuas palavras para com este povo lutador e que está a demonstrar dia para dia com resultados que são extraordinários comparativamente com outros povos aqui ao lado, e que palavras é que tu nos deixas para continuarmos a resistir.
Dr.Pedro: Simples, a resiliência que tivermos agora, é um investimento de que vamos usufruir no futuro. Quanto mais resilientes formos agora, quanto mais corajosos formos agora, quando maior for a nossa força e determinação em restringir-mos os nossos cuidados agora, os nossos contactos, quanto mais isolados nos mantiver-nos agora, mais depressa ultrapassaremos esta crise menor serão as repercussões, portanto isto é um investimento que estamos a fazer quanto maior for este investimento, melhor vai a capitalização porque se não houvesse este investimento, poderíamos ter neste momento os cuidados de saúde a colapsar e esse colapso ia ser pago mais tarde, a nossa economia enfrenter uma crise mais severa que iríamos ter que pagar mais tarde, portanto neste momento temos que pensar assim a nossa resiliência é um investimento, é um investimento importantíssimo que irá ser capitalizado a curto prazo, mas se não houver esta capacidade de resiliência irá tudo por água abaixo e é uma fatura que se irá prolongar ao longo do tempo quanto maior for a nossa capacidades de sofrimento agora, mais depressa iremos sair disto e mais depressa também iremos entrar num novo clima de prosperidade.
Mário: Pedro um grande abraço, foi um prazer ter-te aqui e bom trabalho e antes de mais quero também deixar uma palavra de apreço e de agradecimento aos profissionais de saúde que têm sido extraordinários no trabalho que estão a fazer no terreno, muito obrigado e um abraço a todos.
Dr.Pedro: Muito obrigado Mário por essas palavras, e espero que essas palavras daqui a um ano também sejam continuadas a ser sentidas pela população e por quem a tutela, que infelizmente nem sempre acontece.
Mário: Um grande abraço e obrigado.
Dr.Pedro:Um abraço para ti e para os teus.
Entrevista com Pedro Ribeiro, Médico (Assistente Hospitalar de Medicina Interna Centro Hospitalar Tondela – Viseu E.P.E (Público) e Casa de Saúde de São Mateus (Privado)).
Pedro Ribeiro